quarta-feira, 31 de julho de 2013

 

Wikimedia commons
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Uma campanha mentirosa surgiu nas redes sociais logo depois da aprovação do Estatuto do Nascituro, na última quarta-feira. Para denegrir o projeto que pretende dar garantias jurídicas ao embrião humano, grupos abortistas vêm divulgando o antigo projeto, de 2007, que já sofreu dezenas de mudanças, como se fosse a versão aprovada nesta semana. Apelando a um nível ainda mais baixo de desonestidade, os difamadores criaram o rótulo de “bolsa-estupro”, embora no texto de catorze artigos somente um deles trate de violência sexual. O objetivo do termo pejorativo parece claro. Vincular, por meio da linguagem, o estatuto a um crime horrendo, e assim gerar uma reação negativa a qualquer um que ouça falar do assunto superficialmente.
Sobre esse tipo de estratégia sorrateira, que manda pelos ares qualquer compromisso com a verdade, contanto que se atinja o objetivo pretendido, o colega blogueiro Jorge Ferraz, do Recife, publicou ontem um brilhante artigo. Recomendo muitíssimo a leitura.
Sobre o conteúdo enganoso da campanha, acho que vale a pena ser bastante didático especialmente em dois pontos.
O que o Estatuto do Nascituro não diz:
- Ele vai anular o artigo 128 do Código Penal, e passará a ser crime punível o aborto de um filho fruto de estupro. MENTIRA.
Somente no projeto de 2007 é que constavam novas punições penais relacionadas ao aborto, com mudanças em itens do Código Penal. O texto substitutivo, aprovado pela Comissão de Seguridade Social e Família, em 2010, que é o que está valendo, não propõe nenhuma mudança em matéria penal. Pelo contrário, o texto explicita que fica "ressalvado o disposto no Art. 128 do Código Penal Brasileiro". O aborto de um filho fruto de estupro, portanto, continuará a não ser punido.
- Ele vai obrigar a vítima de estupro a gerar e criar o filho do estuprador. MENTIRA.
Como já dito, a vítima de estupro não será sequer obrigada a gerar a criança, muito menos criá-la. Na verdade, ela ganha uma escolha a mais sobre o que fazer. O que ocorre hoje é que a vítima aborta ou gera o filho com os meios que possui, para depois decidir se o bebê será entregue para a adoção ou se a mãe ficará com ele.
O estatuto cria uma terceira opção. A vítima de estupro que resolver gerar a criança contará com o apoio financeiro do estado para fazê-lo. Se quiser gerar, mas não quiser criar, pode entregá-lo para a adoção. Se escolher criar a criança, a mãe que quiser pode recorrer ao estado para obrigar o pai (criminoso) a pagar pensão.
Essa última possibilidade, naturalmente, só se aplica aos casos em que o autor do estupro é identificado. Afinal, nem toda violência sexual é praticada apenas por marginais desconhecidos que atacam na rua. Parentes, colegas ou patrões, por exemplo, que violentarem a mulher terão de arcar financeiramente com a criação da criança, além de cumprirem a pena na cadeia.
Um estatuto “brando”
As acusações contra o estatuto mostram-se ainda mais fantasiosas quando opostas a outras críticas, dessa vez não de abortistas, mas de dentro do próprio movimento pró-vida. Enquanto para os difamadores atuais, o documento parece trazer as trevas de uma revolução conservadora, há algumas semanas um artigo do padre Luiz Carlos Lodi , um influente veterano pró-vida, dividiu os manifestantes da causa.
Conforme conta no texto, Lodi teve participação no desenvolvimento do projeto original, mas considera que este foi tão modificado que não vale mais a pena batalhar por sua aprovação. Na opinião do sacerdote, outros projetos em tramitação mereceriam maior envolvimento por trazerem mudanças mais drásticas. Entre as observações de Lodi, está a lamentação de que o Movimento Brasil Sem Aborto, principal apoiador do projeto, não vincula sua atuação às iniciativas contrárias à união de homossexuais, como outros grupos fazem.
O episódio ajuda a ilustrar o quanto o projeto tentou equilibrar-se entre posições que podem ser consideradas extremos opostos entre si.
A única “bolsa” criticável ?
Na argumentação dos defensores do aborto, chama a atenção também a crítica ao que chamam de mais uma “bolsa” assistencialista do governo. Esses mesmos grupos quase sempre se alinham às políticas do governo petista e apoiam práticas como o Bolsa Família e similares. Sendo assim, na visão deles a ajuda financeira que o Estatuto do Nascituro pretende dar às vítimas de estupro parece ser o único instrumento criticável de distribuir dinheiro a quem precisa. Uma incoerência e tanto.
Vai demorar
A campanha desesperada dos difamadores pode assustar agora, pela virulência, mas dada sua fragilidade, construída na base de sofismas e especulações, tende a se enfraquecer. Isso exigirá paciência e determinação dos apoiadores do estatuto em mostrar o texto certo e desmascarar mentiras. Teremos tempo.
O Estatuto do Nascituro surgiu oficialmente em 2007, passou pela primeira comissão em 2010, e agora, pela segunda, em 2013. Quem acompanha a tramitação de perto sabe que a próxima etapa vai demorar. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania é do PT, o único partido a votar contra o projeto na última comissão. Além disso, as movimentações para as eleições de 2014 já começaram, e um projeto que envolva o aborto certamente é a última coisa que a presidente Dilma quer ver em sua mesa num ano eleitoral.

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