sexta-feira, 14 de novembro de 2014


BOM DIA PARENTE

De micfrofone em punho, cocar ornando a cabeça de cabelos negros, Sônia, a índia Guajarara de terras maranhenses, cumprimentou a todos do Acampamento Terra Livre, instalado no Aterro do Flamengo. Seus olhos brilharam ao dizer: Bom dia Parentes. A saudação retornou vibrante. As seis organizações que compõem a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, devolveram o mesmo cumprimento. Ainda quando um grupo de bordunas em riste interrompeu irritado as apresentações, a saudação, também a estes, foi a mesma. 
Falas curtas, entremeadas de breves danças, não deixaram dúvidas. Muito mais que a favor da demarcacão de terras, os indígenas se manifestaram fortemente contra o “crescimento verde”, que substitui florestas e várzeas por pastagens, enterra os rios em troca de minérios e homogeniza canaviais onde a biodiversidade imperava. Aos brados de “fora crescimento verde, verde dos dólares”, seguiam-se chamamentos à verdadeira sustentabilidade ancestral, onde Terra, não é apenas território, é alimento, língua, maternidade. O que as cortinas diplomaticamente ritualizadas dos eventos no Riocentro escondem, se escancara na verbalização, sem freios e desculpas, das populações indígenas. A palavra Sustentabilidade flui por toda a parte, como se nada mais houvesse fora deste palco. O grito indígena nos alerta para o descolamento do habitat natural. Imaginamo-nos capazes de que com recursos financeiros e, acertadas decisões políticas podermos alavancar um desenvolvimento aqui denominado de verde. Se estuda, analisa, quantifica e se debate sobre o meio ambiente, mas como entes fora do próprio, quando não, acima do mesmo. Observamos o natural do ponto de vista externo e interventor, ainda que pretendamos dimensionar/mitigar o impacto desta ação/atitude. No fundo, em grande parte, se faz o mesmo de sempre, apenas se agrega algum programa ambiental, para nos justificar e nos apresentar como pessoas, entidades e instituições preocupadas com a sustentabilidade, palavra desgastada, que engessa a verdadeira e necessária Revolução Ambiental.
Sustentabilidade, panaceia, ora ornada pelo Crescimento Verde Inclusivo, ora emoldurada por documentos que pretendemos reformadores por outros 20 anos. Desistimos de sermos naturais, optamos pela Sociedade Ambiental/Social/Monetária, que de original manteve a cor verde, não da clorofila, mas da tinta pigmentada que tem seu preço.
Entre os 30 bilhões de dólares pretendidos para alavancar o desenvolvimento verde ea montanha de intensões, fico com o “BOM DIA PARENTES”, ainda que tenhamos que erguer nossas bordunas.
JOSÉ ALBERTO WENZEL/ GEÓLOGO E ESCRITOR 
(direto do Rio de Janeiro/RJ)

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