domingo, 29 de julho de 2012

A FAMÍLIA MONOPARENTAL: Breves Apontamentos.

Jerri Almeida Preâmbulo O estudo das relações familiares na contemporaneidade implica pensarmos sobre suas novas configurações e mediações. Sabemos que é cada vez mais comum encontrarmos exemplos de filhos que vivem somente com a mãe, com o pai ou com outro parente. O contexto das relações, na sociedade complexa que vivemos, define novos vínculos e novas tendências na composição da família. Conforme apontou Bauman, em seu livro intitulado Amor Líquido[1] – Sobre a fragilidade dos laços humanos, os relacionamentos conjugais tornaram-se, na pós-modernidade, muito “líquidos”, isto é, sem bases sólidas. Os valores sociais e culturais de nossa época contribuem para uma fragilização do casamento, ampliando vertiginosamente o número das separações. Vínculos conjugais são rompidos, enquanto outros são – precipitadamente – iniciados sem o devido comprometimento ou consciência dos fatores responsáveis por imprimir qualidade na convivência conjugal. Separações e divórcios[2] são responsáveis, embora não serem os únicos, pelo aumento da família pós-nuclear. A rigor, com as mudanças socioculturais e comportamentais, principalmente a partir dos anos 60, a mulher conquistando mais liberdade social passou também a assumir sozinha, diante de determinadas contingências, a chefia da família. Inúmeros fatores podem ser relacionados para explicar o surgimento da configuração familiar monoparental. Dentre eles podemos citar: a inseminação artificial, o que permitiu a mulher gerar filhos sem a figura do pai, a adoção, a viuvez e o divórcio. Na prática, define-se geralmente o modelo monoparental quando uma pessoa adulta, pai, mãe, ou outra, quer consanguínea ou não, assume o papel de cuidadora e orientadora de uma ou várias crianças. Este modelo de família é reconhecido no Brasil pela Constituição Federal de 1988, em seu Art. 226 no inciso 4° que diz: “Entende-se também como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”, conferindo-lhe a mesma proteção e segurança do Estado. Conforme o IBGE, de 1995 a 2005, a porcentagem de famílias chefiadas por mulheres com filhos e sem cônjuge passou de 17,4% para 20,1% no Nordeste, e no Sudeste, de 15,9% para 18,3%. Eduardo de Oliveira Leite afirma que: “a monoparentalidade se impôs como fenômeno social nas três últimas décadas, mas, com maior intensidade, nos últimos vinte anos, ou seja, no período em que se constata o maior número de divórcios” [3]. Dois, não somente um! Qual o impacto da falta de um dos pais para os filhos? Existem especificidades no papel de pai e de mãe? E nesse caso, a ausência de um deles poderá ser suprida pelo outro? Não pretendemos nesse estudo, reduzir a complexidade desse modelo de família ao limite de seus aspectos negativos. Todavia, é importante refletirmos mais profundamente sobre o tema em questão. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, encontramos a seguinte afirmação: Quis Deus que os seres se unissem não só pelos laços da carne, mas também pelos da alma, a fim de que a afeição mútua dos esposos se lhes transmitisse aos filhos e que fossem dois, e não um somente, a amá-los, a cuidar deles e a fazê-los progredir. [Grifos meus][4] Não há duvidas que a estrutura familiar, composta por pai e mãe representa um imperativo da natureza para o melhor cumprimento de suas funções. A resposta dos espíritos é clara e objetiva. Partindo desse ponto ideal, devemos também compreender as variáveis que envolvem esse processo. No entanto, é relevante fazermos uma distinção dos papéis que envolvem o homem e a mulher na estrutura familiar. Anotando informações sobre a vida conjugal, André Luiz, no capítulo 20 de Nosso Lar, obteve o seguinte esclarecimento de seu instrutor: “...o lar é como se fora um ângulo reto nas linhas do plano da evolução divina. A reta vertical é o sentimento feminino, envolvido nas inspirações criadoras da vida. A reta horizontal é o sentimento masculino em marcha de realização no campo do progresso comum.” Essa diferenciação das singularidades do homem e da mulher implicam numa dinâmica de complementação extremamente rica, onde o principal beneficiado deveria ser o filho. As funções, comumente aceitas, controladas pelos dois lados do cérebro, podem auxiliar na compreensão das diferenças[5] (que em nenhum momento implicam na ideia de superioridade ou inferioridade) entre homens e mulheres: a) Hemisfério esquerdo (lado direito do cérebro): habilidades matemáticas, raciocínio lógico, o pragmatismo, a objetividade, racionalidade, entre outros. b) Hemisfério direito (no lado esquerdo do cérebro): criatividade, talento para as artes, intuição, imaginação, multiprocessamento, emoções, visão do todo, entre outros. O homem funciona mais no hemisfério esquerdo, enquanto a mulher no hemisfério direito. A evolução espiritual enseja o desenvolvimento de múltiplas potencialidades e, para isso, sabemos que o ser espiritual necessita transitar na polaridade masculina e feminina. Mas como essas especificidades se tornam importantes na estrutura familiar? O escritor e educador Celso Antunes, analisa a dimensão desses papéis afirmando que: A mãe é, por essência, aquela que supre as necessidades de alimento e de afeto; o elo essencial da segurança da criança e, principalmente, a ‘dialogadora’ essencial, a ‘admirável xereta’ que tudo, em todas as idades, através da conversa, busca compartilhar. O homem, sobretudo no Ocidente onde são mais exímios no uso do hemisfério cerebral esquerdo, nunca é parceiro ideal para o papo solto, a conversa disciplinadora, o bom interrogatório. Não que isso o impeça de conversar com os filhos. Deve conversar e muito, mas poucos são os homens capazes de tão bem quanto as mulheres equilibrar a fala à emoção e, dessa forma, ‘abrir’ os pensamentos da criança ou do adolescente.[6] O autor assevera ainda: O pai desempenha na educação dos filhos papel de igual importância, ainda que extremamente diferente. Nos primeiros anos da infância deve inspirar presença e proteção que ao serem demonstradas à esposa ficam claras também para a criança. Mas, a importância paterna cresce de forma extraordinária quando, por volta dos três anos, a criança começa a descobrir sua individualidade e inspira-se no pai para fundamentar a base de sua responsabilidade. Nessa fase, o pai é para a criança o personagem central da família, simbolizando com doçura ‘força’ e ‘poder’. Embora nem sempre se perceba essa distinção entre a ação masculina e a feminina, esta é essencial para o fortalecimento do caráter. A criança cresce descobrindo que existe em sua vida uma autoridade diária e contínua exercida pela figura da mãe e uma outra autoridade, não menor ou maior, mas exercida de forma mais distante, ainda que suprema, simbolizada pela figura do pai. Do pai, como modelo dessa autoridade suprema, deve emanar a base dos conceitos morais da criança, que aos poucos descobre que o pai é o que ama e o que conduz. Os meninos, sobretudo, devem sentir orgulho desse pai a ponto de desejarem ser como ele. O pai distante ou ausente [assim como a ausência da mãe] deixa o vazio, a carência de modelo de força e poder. E não existe na neurologia ou na psicologia qualquer estratégia ou remédio que possam compensar a dimensão dessa ausência.[7] Quando a separação do casal for inevitável ou no caso da desencarnação de um dos cônjuges, por exemplo, ficando a educação dos filhos para apenas uma pessoa, é importante, segundo o referido autor, que esta saiba assumir outras funções e outros papéis. Se bem assumidos, poderão diminuir o impacto ou o vazio deixado, mas jamais o eliminará totalmente. Conclusão O relaxamento dos laços familiares pode gerar doenças e promover insegurança afetiva. A constatação é da cientista da Universidade da Califórnia (EUA), Rena Repetti, após reunir mais de 500 estudos sobre a relação entre família e saúde. A pesquisadora constatou que “crianças que crescem num ambiente de acolhimento e segurança emocional em geral são providas de maior senso de integração social e mais capazes de regular o próprio comportamento para manter a saúde do corpo e da mente...”.[8] Temos visto, em nossa experiência profissional, alunos manifestarem em certos casos, comportamentos indisciplinados, outras vezes, por falta de modelos e de referenciais domésticos, terminam – por carência - deslocando para o professor (a), para um personagem da televisão ou, dependendo da índole desse jovem, para um traficante ou o chefe do tráfico do bairro ou da cidade. Uma família bem resolvida, independentemente se nuclear ou monoparental, se configura num espaço relacional onde as emoções são trabalhadas positivamente, os limites e a disciplina são exigidos, o afeto nutre a convivência, os exemplos positivos estão presentes, e os problemas são enfrentados com responsabilidade, conforme os papéis assumidos e “acumulados”. NOTAS [1] BAUMAN, Zigmunt. Amor Líquido. Sobre a fragilidade dos laços humanos. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2004. [2] No Brasil o divórcio foi instituído pela Lei n. 6.515/77 [3] LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias monoparentais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. P. 21. [4] O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo 22, item 3. [5] PEASE, Allan. Por que os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor? Tradução Neuza M. Simões. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. P. 41. [6] ANTUNES, Celso. Bilhete ao Pai. Petrópolis,RJ: Vozes, 2005. P. 84-85. [7] Idem. [8] Sua Família, sua saúde: A medicina prova que os laços familiares são decisivos para manter o organismo sadio. Este vínculo pode ajudar a combater doenças como asma, depressão e até câncer. Revista Isto É, 16/04/2008, no. 2006, pág. 76-81.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

O MUNDO ÀS AVESSAS

Nas sociedades antigas, anteriores à Era Cristã, as festas pagãs estavam fortemente vinculadas às mudanças de estação, configurando os ritos de passagem. As cerimônias de passagem e de purificação compunham, no universo das representações, a transição do inverno (estação que simbolizava a morte) para a primavera, que anunciava o renascimento da vida. As “saturnalias”, por exemplo, eram festividades oferecidas a Saturno, o deus da fertilidade e, ao qual, associava-se a idéia da abundância e do excesso. Por ocasião desses festejos, instituiu-se uma espécie de reversão da ordem social. Momentaneamente, os escravos assumiam a posição dos senhores, sendo-lhes permitido gozar dos benefícios da classe dominante, em meio a muita comida e bebida. Vivia-se um período festivo onde buscava-se a transgressão temporária da ordem estabelecida. Tais festejos e cerimônias, onde certos participantes usavam máscaras (de animais), dançavam, cantavam e cometiam excessos sexuais, atingem, também, o mundo medieval. A palavra “carnaval” teria, no mínimo, um duplo significado: o primeiro estaria vinculado aos excessos cometidos também em relação à alimentação, daí: “carne vale”; ou, numa segunda hipótese, em referência aos carros alegóricos utilizados nos cortejos: “curris navalis”. Seja como for, o fato é que a “festa dos loucos”, assim denominada na Idade Média, permitia a exaltação dos pobres e oprimidos, na reversão momentânea de suas posições sociais, liberando seus desejos e imaginação. Na prática, essa tradição ancestral, permeada de sincretismo – com suas variações – fazia parte da cultura dos Celtas e Germânicos, povos extremamente importantes na formação da Europa medieval. Esses festejos, muito embora o confronto com a Igreja Católica, terminaram sendo incorporados na cultura Ocidental cristã. Para o filósofo russo Bakhtin, o carnaval representava o “mundo às avessas”, pois originava um mundo “não-oficial”, exterior à Igreja e ao Estado. Assim, o tempo do carnaval ficava pleno de possibilidades e deixava de ser mediado pelas categorias usuais que distinguem os indivíduos: riqueza, posição social, poder, etc. A rigor, adotando-se o viés da “loucura”, ou “loucos” (foliões) poderiam agir com extrema liberdade na manifestação de seus impulsos reprimidos pela ordem religiosa e social vigentes. Todavia, deste o século IV, a Igreja havia instituído o período da quaresma: nos quarenta dias que antecediam a Páscoa os fiéis eram constrangidos a viverem em abstinência da carne (menos de peixe), de sexo e de divertimentos. Isso objetivava um duplo fim: fazer os fiéis relembrarem anualmente o martírio, morte e ascensão de Cristo, e puni-los pelos excessos cometidos no ciclo festivo de inverno (no hemisfério norte), o carnaval. A “festa dos loucos”, trazida pelos portugueses, chegou ao Brasil por volta do final do século XVI. Provavelmente foi nesse período que se introduziu no Brasil o Entrudo. Trazidos por colonizadores portugueses das ilhas da madeira, açores e cabo, No Entrudo as pessoas se jogavam água suja, farinha, ovos, etc. Essa “brincadeira” era praticada em família e, mesmo, nas ruas, gerando-se um problema para as autoridades locais. Para muitos pesquisadores, há uma relação próxima entre esse divertimento e o carnaval. Nesse caso, ocorreu provavelmente, pelo processo histórico, uma fusão ou mescla entre esses dois elementos, definindo novos comportamentos socioculturais. No período monárquico brasileiro, a elite aderiu, obviamente, ao modelo de festa carnavalesca européia, principalmente o de Veneza. Aderiu-se aos bailes de máscara em clubes e teatros. Segundo o antropólogo Roberto Damatta, a partir de 1840 é que os chamados bailes de clubes passaram a ganhar mais espaço na sociedade carioca. Antes disso, o carnaval, no Brasil, era uma espécie de festa familiar e de bairro. Mesmo no início do século XX, por mais que a presença popular fosse ganhando espaço, o carnaval ainda continuava uma festa para os mais abastados. Todavia, foi com o governo de Getúlio Vargas, a partir dos anos 30, que os interesses políticos vigentes permitiram que o carnaval brasileiro assumisse uma matriz mais popular, também de influência negra. Pode-se dizer que no período do Estado Novo (1937-1945), Getúlio buscou a definição de uma “identidade nacional” para o Brasil. Com isso, o carnaval passou a ser trabalhado como um dos três pilares dessa identidade, funcionando como uma espécie de ”festa agregadora” na nacionalidade. O carnaval não é, portanto, uma festa tipicamente brasileira. Em Nova Orleans (EUA) o carnaval começa em 6 de janeiro. Em Veneza, o carnaval ocorre ao longo de dez dias, iniciando em 6 de fevereiro. É um carnaval mais comportado, com as tradicionais máscaras e fantasias que remetem a realeza do passado. Não há músicas características. Na programação se inclui até shows de jazz. Já na Inglaterra o carnaval é celebrado somente em dois dias do feriado bancário do mês de agosto. A festa londrina, por exemplo, envolve desfiles e comilança farta. Em seu livro, “Carnavais, Malandros e Heróis”, Damatta situa o carnaval no universo dos rituais brasileiros, onde uma parcela mais despossuída da sociedade ganha o centro das avenidas e o foco das atenções. É nesses dias que a “atriz global” vai ao encontro dos pobres e anônimos integrantes das escolas de samba, para “aprender” sobre o desfile e ensaiar os passos certos. Esse parece ser um rito que pretensa e superficialmente, assume o papel de homogeneizar as categorias sociais. Categorias que, via de regra, estão à margem da sociedade. Dessa forma, os ritos “revelam coisas”, mas também “encobrem coisas”. Referências BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento. São Paulo: Hucitec/Unb, 1987. DAMATTA, Roberto. Carnavais, Malandros e Heróis. Para uma sociologia do dilema brasileiro. 6a. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. MACEDO, José Rivair. Riso, Cultura e Sociedade na Idade Média. Porto Alegre: Ed. da Universidade/UFRGS, 2000.

sábado, 14 de julho de 2012

PREDISPOSIÇÃO INSTINTIVA

Jerri Almeida A natureza dotou a criatura humana, com amplas capacidades e instrumentais necessários ao seu desenvolvimento ao longo de sua longa jornada de evolução antropológica-espiritual. A evolução da estrutura cerebral é exemplo disso. Conforme aponta o cientista Eugênio Mussak, a primeira parte do cérebro, a mais antiga formada a cerca de 350 milhões de anos, é constituída pelo hipotálamo e pelos núcleos de base, é o denominado “cérebro reptiliano”. Ele seria responsável, entre outras coisas, pelo nosso comportamento instintivo, vinculado à necessidade de preservação da vida. Assim, numa situação de perigo real ou imaginário, o indivíduo assume comportamentos instintivos, muitas vezes também agressivos, no intuito de se auto-preservar. Imaginem dois indivíduos numa ilha isolada com imensa restrição de alimentos? Haveria espaço para uma divisão “civilizada” do alimento? Talvez houvesse até o momento limite da sobrevivência para ambos. Nesse momento crítico, as pessoas não conseguiriam mais raciocinar adequadamente, assumindo posturas maquinais, instintivas e agressivas na defesa de sua preservação. Ocorre que com a evolução morfológica e fisiológica do cérebro, surge outra parte, “mais nova”, (algo em torno de 10 milhões de anos atrás) responsável no ser humano, pelas emoções e sentimentos: o sistema límbico. Há muitas mulheres que vivem sob o domínio das emoções. Deixam-se dominar por seus companheiros e, quando ocorre uma ruptura nesse relacionamento, não conseguem mais fazer nada. Deprimem-se, a vida perde o sentido, não se alimentam adequadamente, afastam-se dos amigos e da família. Quando se apaixonam, independente do caráter ou temperamento do outro, ficam fascinadas. Não desejam perceber o outro como ele realmente é, mas conforme aquela matriz idealizada por elas. A parte mais nova do cérebro, com apenas 50 mil anos, o neocórtex (também chamado de massa cinzenta), seria o responsável pela função do pensamento. Logo, a parte instintiva é a mais antiga no ser humano, seguida pelas emoções. Pode-se dizer, sem nenhum demérito para ninguém, que possuímos um “animal” dentro de nós. Mas também, como já mencionamos, existem pessoas que se deixam governar pelas emoções. O sistema límbico está fortemente vinculado ao princípio do prazer e para a fuga do desprazer. Nesse ponto, devemos articular também o princípio da paixão. A paixão é uma emoção forte, arrebatadora que compromete o discernimento. As paixões, portanto, estão muito vinculadas a temas como: sexo, dinheiro, fama, jogo, poder e beleza. A própria ideia de “justiça” muitas vezes, termina sendo cooptada ou corrompida pela paixão, conforme esclarecem os espíritos para Allan Kardec na questão 874 de O Livro dos Espíritos: “É porque a esse sentimento [de justiça] se misturam paixões que o alteram, como sucede à maior parte dos outros sentimentos naturais, fazendo que os homens vejam as coisas por um prisma falso.” Ou seja, quando a paixão domina no homem, ele acaba elaborando sua própria, e muitas vezes errada, noção de justiça. A capacidade de pensar e raciocinar, como aludimos, é algo muito recente para a espécie humana. O pensamento, do ponto de vista da evolução cerebral, foi a última estrutura que apareceu. Por isso, em termos de nossa evolução planetária, grande parte das pessoas são muito instintivas (com boa dose de agressividade) e também bastante emocionais (com forte apelo das paixões). A mistura entre “instinto” e “paixão” é um componente extremamente perigoso. Isso abre espaço para relacionamentos precipitados, já com “data de validade” vencida. Pessoas assim terminam criando relacionamentos desastrosos, permeados de emoções em desequilíbrio. O princípio da paixão não é originariamente mal. O problema, alerta a questão 907, de O Livro dos Espíritos, reside no “excesso” ou o “abuso” que delas fazem os homens. Ocorre que quando o indivíduo deixa-se dominar pelos instintos e pelas paixões, volta a bestialidade da fera. Nesse sentido, o grande desafio da evolução, é permitir ao pensamento uma ascendência sobre essa estrutura ancestral, empenhando esforços na educação de seus impulsos, emoções e sentimentos. Para isso, no entanto, é necessário que o sujeito já tenha atingido certo nível de maturidade interior que lhe permita essa disposição. A rigor, vamos observar a pergunta de Kardec para os benfeitores, e a resposta bastante clara, da questão 845 de O Livro dos Espíritos: Não constituem obstáculos ao exercício do livre-arbítrio as predisposições instintivas que o homem traz consigo ao nascer? “As predisposições instintivas são as do Espírito antes de encarnar. Conforme seja este mais ou menos adiantado, elas podem arrastá-lo à prática de atos repreensíveis, no que será secundado pelos Espíritos que simpatizam com essas disposições. Não há, porém, arrastamento irresistível, uma vez que se tenha a vontade de resistir. Lembrai-vos que querer é poder.”

domingo, 8 de julho de 2012


À Sombra do Golpe: crise da democracia, implantação 

da ditadura no Brasil e os anos rebeldes


Jerri Almeida
Historiador. Especialista em Diálogos entre História e Literatura do RS.


A vexatória renúncia de Jânio Quadros à presidência da república, em 
agosto de 1961, instaura a denominada “crise da legalidade”, um período
 turbulento e delicado pela não aceitação das forças armadas à assunção
 do vice-presidente, João Goulart (Jango), ao poder. Os desdobramentos 
desse fato colocariam em xeque a incipiente e frágil democracia brasileira, 
culminando em 31 de março de 1964 com o golpe que implantou, por vinte 
e um anos, a ditadura militar no Brasil.
Jango, um homem enigmático, herdeiro do trabalhismo de Getúlio Vargas, 
desde fins de 1961, defendia a necessidade das “reformas de base” que
 atingiria a questão agrária, a universidade, a área tributária e eleitoral. 
O projeto de Jango sofreu forte resistência dos setores conservadores da
 sociedade, sendo – por fim – derrotado no Congresso. Se por um lado, havia
 por parte desses setores elitistas uma forte resistência à tradição 
do Estado Populista, personificado agora na figura de Jango, por outro, vários
 setores mobilizavam-se, como é o caso das Ligas Camponesas e da UNE
 (União Nacional dos Estudantes) visando imprimir, radicalmente, essas 
reformas no campo e na cidade.
Em época de Guerra Fria, sob o impacto ainda recente da Revolução Cubana
 (1959), a elite brasileira via com  temeridade o “fantasma do comunismo” que
 rondava o Brasil sob a égide das políticas sociais de João Goulart. Nesse
 contexto, as Forças Armadas estavam divididas em dois grupos: os que
 defendiam como necessárias as transformações na sociedade brasileira, e 
os que se opunham radicalmente ao governo Jango, acusando-o de ligações
 com o comunismo. O clima se acirrou, ainda mais, com o grande comício da 
Central do Brasil, em 13 março de 1964, no antigo Estado da Guanabara, 
quando, diante de uma imensa concentração de 150 mil pessoas, Goulart 
]anunciou uma série de medidas radicais como a reforma agrária e a nacionalização
 das refinarias de petróleo, o que significava uma atitude que passava por 
cima do Congresso, explorando-se os poderes do executivo.
Entretanto, no caso de protesto do Congresso, Jango tencionava recorrer, 
novamente, ao “plebiscito” para demonstrar o apoio popular para suas reformas. 
Essa nova fase de Jango, inegavelmente, iniciou com o comício da sexta-feira 
13 de março. Em seu discurso, o presidente enfatizou a necessidade da 
reforma agrária e de uma nova Constituição que melhorasse a ordem sócio-
econômica do Brasil. Todavia, Jango jamais organizara realmente uma base 
de apoio popular consistente para as reformas almejadas. Para o historiador
 Thomas Skidmore, a aproximação de Goulart da esquerda radical, da qual 
fazia parte Brizola, fez com que ele perdesse o apoio dos militares.
Aquilo que para os setores de esquerda radical,  era um governo democrático,
 que pretendia mexer na política fundiária e diminuir o fosso das desigualdades
 sociais da sociedade brasileira, era, para os conservadores, proprietário de 
terras, políticos direitistas,  Igreja Católica, etc, o prenúncio da “desordem 
comunista” que deveria ser barrada. A reação inicial desses setores 
conservadores foi a realização em São Paulo, em 19 de março de 1964, 
]da “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”. Defendia-se o 
anticomunismo, a moral e a família.  Governadores como Adhemar de 
Barros (SP) e Carlos Lacerda (GB) chegaram, inclusive, apoiar abertamente
 a rebelião contra o Governo Federal.
O 13 de março solidificou a oposição a Jango. As forças políticas do Centro 
migraram para a Direita Radical, fortalecendo-se o discurso de que o Presidente
 havia rejeitado a democracia. A oficialidade militar passou a olhar para Jango 
como um “subversivo” e, logo, caíram no ataque. De alguma forma revivia-se 
o ano de 1954 quando Getulio era forçado a abandonar o poder, fato que 
culminou em seu suicídio.
Preparava-se, sob o comando do General Castelo Branco, o golpe, não 
contra Jango, mas contra a incipiente democracia brasileira.
Um conjunto de articulações, no interior das Forças Armadas, tomou vulto 
em 20 de março de 64. Um grupo mais intelectualizado, de oficiais, sob o 
comando do General Castelo Branco, preparava-se para o golpe sob o pretexto
 de que o papel histórico das Forças Armadas era o de defender a ordem 
constitucional do país. Com o apoio do Governador de Minas Gerais, Magalhães
] Pinto, o general Olympio Mourão Filho pôs suas tropas a marcharem para 
o Rio de Janeiro, detonando, assim, o golpe militar contra o governo João 
Goulart, em 31 de março de 1964.
Praticamente, a única iniciativa de resistência contra o golpe veio de Leonel 
Brizola, do PTB do Rio Grande do Sul. Todavia, Jango, que, para alguns 
historiadores, era portador de uma personalidade conciliatória, encarou com 
realismo a deposição, o que gerou, sabidamente, uma indisposição com seu
 cunhado, pois Brizola o estimulava a resistir na defesa de seu mandato.
A movimentação das tropas deslocou-se de Minas Gerais e São Paulo em 
direção ao Rio de Janeiro o qual era sede do 1º. Exército, do qual se 
esperava uma possível reação na defesa de João Goulart. O General
 Âncora, comandante do 1º. Exército ao telefonar para o palácio presidencial 
em busca de instruções, soube que o presidente havia se evadido rumo a Porto
 Alegre, deixando o recado de que não desejava, sob nenhuma hipótese, o 
choque entre militares.
Ao chegar em Porto Alegre, Jango ainda ouviu o apelo desesperado de 
Brizola, informando que o General Ladário Teles, comandante do 3º. Exército, 
estava ao seu lado oferecendo resistência, muito embora, o próprio governador
 do Rio Grande do Sul, Ildo Meneghetti, que temia a guerra civil, já ter fugido 
para o interior do Estado. Brizola chegou a chorar para que seu cunhado 
resistisse, mas foi em vão.  Jango também fugiu para o interior do RS, e depois 
exilou-se no Uruguai, seguido, logo depois, por Brizola.
O golpe de 64 negou ao povo brasileiro o direito de amadurecer a sua 
experiência democrática, essencial para o aperfeiçoamento das instituições
 e dos poderes, além de bloquear, por 21 anos, a construção de um país 
com mais justiça social. Não era a primeira vez que as forças armadas intervinham
 para obstaculizar os conflitos da política brasileira. Em 1954 algumas ações já
 haviam sido feitas. Mas em 1964, pela primeira vez, o exército estava unido 
contra o populismo, o qual: “pretendia perturbar a democracia brasileira.”
A esquerda brasileira, na órbita de seu radicalismo, ficou perplexa, e perdida,
 diante do golpe. É bom que se diga que João Goulart foi deposto por uma 
revolta militar e não por uma elite política oposicionista. O próprio Congresso 
Nacional não havia endossado nenhum pedido de impeachment, pois sabiam 
não haver votos suficientes. Seja como for, o Brasil, a partir da implementação
 do regime ditatorial, mergulhou numa infame névoa que 
obscureceu, sistematicamente, a liberdade de expressão e de participação 
política da população. Mais, os governos que se iniciavam souberam 
destroçar completamente o sistema político formado durante o período democrático.
A poderosa máquina repressiva, instalada, principalmente, a partir da 
decretação do Ato Institucional no. 5, fez com que o “combate à 
subversão” justificasse a total liberdade de ação de órgãos policiais que 
espalhavam terror sobre a sociedade, prendendo, torturando e assassinando 
supostos comunistas. As mortes, nos porões do DOI-CODI, eram encobertas
 por versões falsas de “atropelamento” ou “morte por acidente de trabalho”.
A arbitrariedade do poder, pelo governo ditatorial, se fez presente na 
censura aos meios de comunicação, nos festivais de música, no teatro, nas 
escolas e nos cinemas. Sem condições de produzir, uma significativa 
parcela de artistas e intelectuais brasileiros viram-se constrangidos ao exílio. 
Era a fase do: “Brasil: ame-o, ou deixe-o”. Na verdade, “amar o Brasil” era 
aceitar as arbitrariedades do próprio regime.
O golpe de 31 de março de 1964 castrou, e por isso deve ser 
periodicamente relembrado, o valor inalienável da democracia e da participação 
efetiva das pessoas na vida de seu país.
Chegando ao poder, os militares realizaram profunda alteração 
constitucional, promulgaram o Ato Institucional nº 1 — que cassou 
mandatos, suspendeu a imunidade parlamentar e direitos políticos — e 
promoveram a eleição, pelo Congresso Nacional, de um novo presidente, 
o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, que governou até 1967. 
Os partidos políticos foram abolidos e instalado o bipartidarismo.
No campo econômico foi definido um modelo baseado no 
binômio desenvolvimento/segurança. O planejamento centralizado contribuiu 
para a estatização da economia, desempenhando o Estado atividades
 de gerenciamento da produção. Como ocorreu em outros países, a crise 
mundial da década de 1970 agravou o problema econômico brasileiro, 
acentuando a concentração de renda e os problemas das populações mais
 pobres.
Ato Institucional nº 5 ou AI-5, decreto governamental de 13 de dezembro
 de 1968, assinado pelo presidente Artur da Costa e Silva, suspendendo 
garantias constitucionais e fortalecendo a repressão aos que se 
opunham ao Movimento Militar de 1964:
Através desse Ato, o presidente podia:
a) fechar o Congresso Nacional por tempo indeterminado toda vez que 
deputados e senadores “atrapalhassem”, com suas críticas e votações, os
 projetos do Governo militar;
b) suspender direitos políticos. Se um deputado ou senador fizesse 
“oposição exagerada”, o presidente poderia “cassa-lo”;
c) Suspender direitos legais. A partir do AI-5, tornou-se comum a polícia invadir
 a casa das pessoas sem autorização judicial. O preso político era levado a
 um local desconhecido e não podia se comunicar com seus familiares..
O recrudescimento do movimento estudantil contra o governo, bem como 
o início de atividades terroristas, em 1968, foram invocados como motivos 
para colocar em recesso o Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas
 e as Câmaras Municipais, e realizar novas cassações de mandatos e direitos 
políticos, além de aposentar funcionários públicos, sobretudo 
professores universitários, tidos como contrários ao regime, atingindo, entre
 outros, o ex-governador Carlos Lacerda. Concedeu ao presidente poder para 
governar por meio de decretos e estabeleceu a censura.
A tortura foi indiscriminadamente aplicada no Brasil.  Pessoas suspeitas 
de serem “subversivas ao sistema”, isto é, de estarem contra o governo militar,
 eram torturadas pelos órgãos de repressão criados pela ditadura. No caso da 
tortura, não se tratava apenas de produzir, no corpo da vítima, uma dor que a
 fizesse confessar possíveis “planos” contra o regime. A tortura também 
possuía um componente emocional, assim crianças eram torturadas diante 
de seus pais, mulheres diante do marido, marido na frente da esposa, etc. 
Muitos morreram ou estão desaparecidos até hoje.
O ato vigorou até 1979, quando foi revogado no processo de abertura 
política impulsionada no governo de Ernesto Geisel.
O fim da ditadura militar no Brasil pode ser explicado através de vários motivos. 
Entre eles, podemos citar:
a) a grave crise econômica do país, fruto dos enormes gastos com a construção 
de obras faraônicas como a ponte Rio-Niterói e a rodovia Transsamazônica. 
A crise do petróleo nos anos 70 colaborou para o agravamento dessa crise. 
A inflação aumentado e a política econômica do ministro Delfim Neto não
 lograram reverter a situação complexa do país.
b) o conflito entre as forças internas do próprio regime militar. Os órgãos 
criados para reprimir,  prender e torturar os “inimigos políticos do sistema”, 
com o tempo, passaram a gozar de muitos poderes, criando por conta própria
 uma autonomia muito grande em relação ao governo. Não foram poucos os 
conflitos entre delegados do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social)
 e o comando do exército pela captura dos mencionados inimigos políticos. 
Tal crise se agravou ainda mais quando passou a existir o chamado “esquadrão 
da morte”, formado por policiais civis que partiram para o extermínio de “bandidos”.
c) as pressões dos trabalhadores. A crise econômica por que passava o
 país fez aumentar o número de desemprego e o arrocho (perda) salarial. Na 
região do A,B,C paulista, região de grande concentração de indústrias metalúrgicas, 
os sindicados passaram a organizar grandes manifestações e greves por 
melhores condições de trabalho e de valorização salarial.
Diante de um quadro cercado de crises, os militares resolvem de forma 
“lenta e gradual” devolver o poder político do Brasil à sociedade civil.

Anos 60: os anos rebeldes

A conjuntura política dos anos 60 deu novo rumo a cultura de massas. Os militares
 que se estabeleceram no poder passaram a praticar a censura aos 
meios de comunicação, pois temiam que a influência do rádio e da televisão 
sobre a cultura popular pudesse ameaçar a "Segurança Nacional". Órgãos de 
controle dos meios de comunicação foram instalados nas rádios, jornais, 
revistas e redes de televisão para cuidar das informações e das notícias que
 seriam passadas para a população brasileira. Era a censura.
Nos outros meios de difusão cultural não foi diferente. Teatro, música, cinema
 também foram alvos da ditadura militar. Artistas, compositores, autores de
 peças teatrais foram perseguidos pelos órgãos de censura.
A produção de cultura passava pela arrogância dos militares que viam em 
tudo uma ameaça comunista. Por trás de uma letra de música, de um diálogo
 numa peça teatral ou num filme escondia-se o "perigo vermelho". De fato a 
rebeldia da juventude, dos intelectuais e artistas brasileiros engajados na luta 
contra a ditadura dava motivos para os órgãos de repressão agirem contra os 
meios de comunicação e de produção culturais. Esses meios, aliás, 
tornaram-se instrumentos da propaganda do regime militar.
Mas, mesmo assim, a arte conseguia encontrar brechas nos muros 
erguidos pela ditadura e, até, confrontar-se com ela. No cenário artístico-
cultural duas alternativas se apresentaram: o protesto contra o regime e as 
denúncias e críticas aos hábitos da sociedade brasileira.
No teatro, por exemplo, o grupo Opinião em 1965 montou a peça Liberdade 
Liberdade. Em 1966 Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. O Teatro
 de Arena encenava Arena conta Zumbi e Arena conta Tiradentes. O TUCA 
(teatros universitários) também montava peças de protesto.
Na música Geraldo Vandré, Edu Lobo, Chico Buarque compunham letras de 
protesto contra o regime militar. De outro lado surgia a Jovem Guarda, com 
músicas que falavam de beijos, amor, sexo, numa linha de rebeldia contra 
costumes da época. No final dos anos 60 aparecia o Tropicalismo uma 
tendência artística que busca uma nova linguagem, criticando valores 
estabelecidos, concebendo a melodia e as letras de uma maneira diferente 
da Jovem Guardam, da música de protesto, da bossa nova, embora 
incorporasse elementos destes e de outros estilos e influências (Jimmy 
Hendrix, Beatles). Chegou a atingir cinema e teatro, não se limitando à música. 
Foram destaques da tropicália - Caetano Veloso, Gilberto Gil, os Mutantes, 
Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade em sua peça Macunaíma.
Tivemos também expressões da contracultura aqui no Brasil nos idos anos 60. 
No cinema, na literatura, no jornalismo alternativo buscava-se 
enfocar o homossexualismo, as minorias, as drogas, etc. Também conhecido
 como pós-tropicalismo teve seus destaques em nomes como Torquato Neto, 
Waly Sailormoon, em jornais como o Pasquim, Bondinho e Flor do Mal.
Os anos 60 significaram muito em nossa história. Primeiro pela própria ditadura 
militar que através da repressão, dos inúmeros atos de tortura, da censura,
 da propaganda acabou marcando as gerações que vivenciaram o terror 
daqueles anos. A juventude, principalmente, reagiu ou se conformou aos
 atos autoritários. A imaginação e a criatividade não foram caladas pelos 
instrumentos de repressão, mas muitos morreram pelas causas que defenderam.
 Os menos famosos, os desaparecidos políticos, os prisioneiros, aqueles que 
foram torturados, compõem uma legião que permanece até hoje no anonimato. 
É uma parcela de nossa história que não se apagará facilmente. As heranças
 desse passado recente com as intensas transformações estão ainda vivas no 
Brasil do início do século XXI.



Referências Bibliográficas

BARROS, Edgar Luiz de. O Brasil de 1945 a 1964. São Paulo: Contexto, 1994.
BRANDÃO, Antonio Carlos. DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos 
culturais de juventude.  2ª. Ed. São Paulo: Moderna, 2004.
HABERT, Nadine. A Década de 70: Apogeu e crise da ditadura militar 
brasileira. São Paulo: Ática, 2003.
NAPOLITANO, Marcos. O regime militar brasileiro: 1964-1985. 4ª. Ed. 
São Paulo: Atual, 1998.
SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo (1030-1964).  9ª. Ed. 
 Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.

quinta-feira, 5 de julho de 2012


Apreciando Léon Denis


“O Espiritismo baseia-se num completo conjunto de fatos: uns simplesmente físicos nos têm revelado a existência e o modo de ação de forças há muito tempo desconhecidas; outros têm um caráter inteligente. São eles: a escrita direta ou automática, a tiptologia, os discursos pronunciados em transe ou por incorporação. Todas essas manifestações, já as passamos em revista e já as analisamos em outras publicações. Vimos que elas são frequentemente acompanhadas de sinais, de provas que estabelecem a identidade e a intervenção das almas humanas que viveram na Terra e que foram libertadas pela morte. Foi por meio desses fenômenos que os espíritos espalharam seus ensinamentos no mundo, e esses ensinamentos foram, como veremos, confirmados experimentalmente em muitos lugares.
O Espiritismo se dirige, portanto, ao mesmo tempo aos sentidos e à inteligência. Experimental, quando estuda os fenômenos que lhe servem de base; racional, quando verifica os ensinamentos que deles derivam. Constitui um instrumento poderoso para a busca da verdade, uma vez que pode servir simultaneamente em todos os domínios do conhecimento.
As revelações dos espíritos, dizíamos, são confirmadas pela experiência. Sob o nome de fluidos, os espíritos nos têm ensinado teoricamente e demonstrado na prática, desde 1850, a existência das forças incalculáveis que a ciência rejeitava a priori. Sir W. Crookes, entre os sábios que tinham grande autoridade, foi o primeiro que constatou depois a realidade dessas forças, e a ciência atual reconhece nelas, a cada dia, a importância e a variedade, graças às descobertas célebres de Roentgen, Hertz, Becquerel, Curie, G. Le Bon, etc.
Os espíritos afirmavam e demonstravam a ação possível da alma sobre a alma, em todas as distâncias, sem o auxílio dos órgãos, e essa ordem de fatos gerou oposição e incredulidade. Acontece que os fenômenos da telepatia, da sugestão mental, da transmissão dos pensamentos, observados e provocados hoje em todos os meios, vieram, aos milhares, confirmar essas revelações. Os espíritos ensinavam a preexistência, a sobrevivência,  as vidas sucessivas da alma. E eis que as experiências de F. Colavida, E. Marata, as do coronel De Rochas, as minhas, etc. estabeleceram que não apenas as lembranças dos menores detalhes da vida atual até a mais tenra infância e mais ainda as das vidas anteriores estão gravadas nas profundezas da consciência. Um passado inteiro, ocultado no estado de vigília, reaparece, revive no estado de transe. De fato, essas lembranças puderam ser reconstituídas num certo número de pacientes adormecidos, como mais tarde o estabeleceremos, quando abordarmos mais especificamente essa questão.
Vê-se que o Espiritismo não poderá, a exemplo das antigas doutrinas espiritualistas, ser considerado um puro conceito metafísico. Ele se apresenta com um caráter muito diverso e responde às exigências de uma geração educada na escola do criticismo e do racionalismo, que se tornou desconfiada dos exageros de um misticismo mórbido e agonizante. Hoje, já não basta crer; quer-se saber. Nenhuma concepção filosófica ou moral tem a chance de ter sucesso se não se apoiar sobre uma demonstração ao mesmo tempo lógica, matemática e positiva e se, além disso, não a coroar uma sanção que satisfaça a todos os nossos instintos de justiça. Pode-se observar que essas condições foram perfeitamente preenchidas por Allan Kardec na magistral exposição feita por ele em O Livro dos Espíritos.” (Páginas 27 a 29)

 Fonte:
DENIS, Léon, 1846 - 1927. O problema do ser: 1ª parte / Léon Denis; [tradução Renata Barboza da Silva, Simone T. Nakamura Bele da Silva]. – São Paulo : Petit, 2000. – (Coleção o problema do ser, do destino e da dor)

domingo, 1 de julho de 2012


Há 10 anos o Brasil e o mundo se despediam de Chico Xavier

Publicado em 29.06.2012, às 13h02


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Foto: Arquivo

Isabelle FigueirôaDo NE10
O homem simples que, apesar de professar a fé espírita, transcendeu religiões pela prática do bem, fechou os olhos para o mundo dos vivos há exatos dez anos para dar lugar ao mito que permanece mais presente do que nunca nos corações de quem o admira. Francisco Cândido Xavier, ícone do Espiritismo no Brasil, faleceu no dia 30 de junho de 2002. Como numa profecia, o médium havia dito que queria morrer num momento de alegria para os brasileiros. Ele acertou: naquele dia, a seleção de futebol foi pentacampeã da Copa do Mundo.
Há uma década o "mui amado Tio Chico", como gostavam de chamá-lo amigos mais próximos, retornava à pátria espiritual a qual ajudou a desvendar por meio de mensagens orais e escritas, ditadas pelos espíritos. Em contato com o mundo invisível desde criança, faculdade denominada pela doutrina espírita de mediunidade, Chico Xavier psicografou mais de 400 livros, entre romances, poesias, livros de mensagens e de estudo, mesmo tendo concluído apenas o ensino primário.
» Ouça mensagens na voz de Chico Xavier:
Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim
Além dos livros publicados, Chico ganhou fama depois das participações no programa de televisão Pinga Fogo, veiculado pela extinta TV Tupi Canal 4 de São Paulo, nos dias 28 de julho e 21 de dezembro de 1971. O primeiro programa, com previsão inicial para durar uma hora, acabou por se estender por mais de três horas, enquanto a segunda edição durou quatro horas.
Ao vivo e com retransmissão em rede nacional - fato pouco comum para as emissoras de TV da época -, o médium foi sabatinado por jornalistas conceituados como Saulo Gomes, Herculano Pires e Durval Monteiro, além do intelectual católico João Scantimburgo e do cientista espiritista Hernani Guimarães Andrade. Foi um inegável sucesso de audiência, com 75% dos televisores da cidade de São Paulo sintonizados no programa.
Apesar de toda notoriedade, o mineiro era exemplo de humildade. Todo o dinheiro da venda dos livros foi destinado a obras assistenciais, primeiro em Pedro Leopoldo (MG), onde nasceu, depois em Uberaba (MG), onde passou a viver no final da década de 50. Mais do que livros e programas de TV para divulgar o espiritismo, Chico deixou um legado de consolação, amor e caridade.
A obra de Chico Xavier - escrita e exemplificada - continua, mesmo após seu desencarne (como os espíritas chamam a morte), a orientar e acalentar o coração de milhares de pessoas. O médium faleceu em Uberaba, aos 92 anos, vítima de um ataque cardíaco.